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O meu pensamento muitas vezes trabalha silenciosamente 
Com a mesma doçura duma máquina untada que se move sem fazer barulho 
Sinto-me bem quando ela assim vai e ponho-me imóvel 
Para não desmanchar o equilíbrio que me faz tê-lo desse modo  
Pressinto que é nesses momentos que o meu pensamento é claro  
Mas eu não o oiço e silencioso ele trabalha sempre de mansinho  
Como uma máquina untada movida por uma correia  
E não posso ouvir senão o deslizar sereno das peças que trabalham  
Eu lembro-me às vezes de que todas as outras pessoas devem sentir isto como eu 
Mas dizem que lhes dói a cabeça ou sentem tonturas 
Esta lembrança veio-me como me podia vir outra qualquer 
Como por exemplo a de que eles não sentem esse deslizar 
E não pensam em que o não sentem...
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Fernando Pessoa
 
 
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