Aqueles que, só pela mão da fortuna, de vulgares cidadãos se tornam príncipes alcançam o mando com pouca fadiga, mas só com muito esforço o conseguem manter. Não experimentam dificuldades na caminhada para o poder, parecendo que para lá vão voando. As dificuldades surgem depois de serem entronizados. (...) Os que assim sobem à condição de príncipe ficam dependentes da vontade e da fortuna de quem lhes proporcionou o trono, que são duas coisas assaz volúveis e instáveis, não sabendo nem podendo garantir a sua conservação. Não sabem - porque, a menos que seja um homem de grande habilidade e virtude, não é razoável que, tendo sempre vivido como vulgar cidadão, saiba comandar; não podem - porque não dispõem de forças que lhes possam ser amigas e fiéis. Além disto, os estados que surgem de repente, como todas as outras coisas da natureza que nascem e crescem rapidamente, não desenvolvem as raízes, o tronco e os ramos, sendo destruídos pelo primeiro temporal. Isto, a menos que aqueles que, como eu disse, de repente se tornaram príncipes possuam tanta virtude como a fortuna que tiveram quando o estado lhes caiu no regaço e saibam, rapidamente, preparar-se para o conservar. (…)
Nicolo Maquiavel, in 'O Príncipe'
O meu amigo Josué saiu do emprego onde trabalhou durante muitos anos. Nove ou dez já não sei precisar. Parece que foi para outro emprego onde o novo patrão reconhece o esforço e o empenho de quem gosta realmente de trabalhar. Recebe mais, passa melhor e sente-se muito bem, diz ele que nunca foi recebido de tal forma nem teve nunca as excelentes condições de trabalho que tem hoje. Continua a trabalhar muito e a descansar pouco, tal qual ele gosta.
Mas lá no antigo emprego nem toda a gente gostou e agora é que a porca torce o rabo – oh pá, vão ter de trabalhar mais. Mas lá até sabem trabalhar, o pior não é isso…
É que parece que chegou a hora do Príncipe. Entrou no seu castelo senhorial que, logo, logo revolucionou. Tudo foi esmiuçado e levianamente achincalhado; o que não estava à vista virou calúnia; críticas choveram de todos os lados e a todos acusaram, pelo que outros fizeram e pelo que não fizeram e pelo que podiam ter feito ou que ainda está por fazer…
É sempre assim quando há uma transição de poderes e seres… o passado não existe ou então, tudo o que fez, não tem qualidade e nada vale; é por estas e por outras razões que cada dia que passa menos carolas há para gerirem interesses desinteressantes e gratuitos.
Mas também se tem de acreditar em novas ideias e ideais, para melhor se fazer; isso seria óptimo!! Claro está que o Josué não acredita em nada disto. Só quer ver para acreditar!!
Parece que este Príncipe já lá estava antes mas não mandava nada. Aliás não queria saber de nada. Desconhecia tudo, mas até reconhecia saber sempre tudo. É esquisito ser assim!
Mas o que não sabiam é que o Príncipe também acha que os seus serviçais não são dignos dos aposentos que ocupam e parece que (acha ele) separando as águas, as ondas negativas depositadas ao longo dos anos nas paredes do palacete, servirão para arejar os espaços e não contagiarão negativamente mais ninguém e, mantém a atitude incoerente e megalómana, que se apressa a impor.
Quando ele pensa e opina, os seus fiéis seguidores fazem a respectiva vénia de subserviência total, coitadinhos!! Senão, cai o carmo e a trindade sobre as suas cabeças! Não sabem eles que ao primeiro desmoronar de pedras, este Príncipe aliado a poderes ocultos e paranormais, esfumar-se-á num ápice, como que num passe de magia, deixando os seus fiéis seguidores na incerteza e com as culpas no cartório de todas as manigâncias e esquemas encapuçados.
As boas ideias levou-as há muito tempo o vento que por ali passou, por entre as frestas das ameias entreabertas, deixando um ondular melancólico do pano desfraldado da bandeira azul e branca ainda suja pelo pó da masmorra fétida onde um dia a depositaram……
A imaginação é rica em cenários, quase sempre fruto dos devaneios que ocorrem em ápices de deslumbramento e sonho, logo após uma forte e poderosa bebedeira!!!
O Josué afirma a pés juntos que parece mesmo já ter passado por aquele palacete. Havia ali algo de familiar, era uma sensação boa de sentir e de se estar bem mesmo, mas que num instante se desvaneceu como nuvens negras se desfazem bruscamente no ar quente em caiem gota a gota meticulosamente em chuva viscosa e morna.
Talvez fosse da ressaca!
O meu amigo Josué está muito contente com a vida que vai levando, calma e descontraída. Cada dia que passa mais aprende e mais se interessa pelos verdadeiros e reais valores que o dia a dia lhe proporciona.
Vive um dia de cada vez, mas com intensidade controlada. E como é aquele grande sentimentalão, tem sempre na memória a saudade eterna de todos os momentos bons que a memória encerra, como peças dum puzzle que a vida lhe montou. É nestes momentos que nada se lhe pode dizer, pois fica de tal forma sério e abstraído do que o rodeia, que mete respeito e receio. E então é melhor deixá-lo no seu passado real e no seu sonho de um futuro melhor e promissor. O melhor é fugir de perto. Nestas alturas é um chato! Não há pessoa mais casmurra que o meu amigo Josué . Ele até o diz sorrindo: «Ninguém é mais teimoso do que eu; ainda está para nascer o meu substituto!!»
Mas no fundo no fundo ele é mas é um persistente que sabe muito bem o que pretende e que vai persistir mais e mais até alcançar objectivos há muito tempo definidos.
Um destes dias vamos encontrar-nos de novo e cortar de fio a pavio todas as novidades do nosso burgo, e quem sabe, falar das novidades do tal palacete e do tal Príncipe que até nem tem orelhas de burro!!
Mas essa é outra história p’ra contar.
Até lá….
Malafaia
2009-10
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