O
historiador Marc Bloch afirmava, citando de memória outro autor: “em
todas as coisas humanas, são sobretudo dignas de estudo as origens”.
Nada é mais verdadeiro.
O interesse por essas origens
é tanto maior e mais intensamente vivido quanto mais misteriosas e
paradoxais as possamos antever ou perceber, justificando plenamente a
citação que Edgar Morin escolheu como abertura ao último capítulo do
Paradigma Perdido: “ o que é claro de mais não é interessante”.
O
desafio é tanto maior e tanto mais válido, quanto mais difícil se torna
penetrar no âmago das coisas humanas, numa tentativa de redescobrir o
passado. Tudo isto é válido no que respeita a Portalegre.
Como
mais antigas referências documentais aponta-se o foral de D. Afonso III
(1259) – cujo texto permanece desconhecido – e uma carta datada de
Abril de 1229, em que João Peres Avoino e Marinha Afonso vendiam umas
casas que possuíam na vila de Portalegre, ao Mestre da Ordem dos
Templários. No aglomerado urbano, deparamos também com alguns monumentos
– as muralhas, mandadas construir por D. Dinis, o Convento de Santa
Clara, o Convento de S. Francisco, e a Igreja do Espírito Santo (Século
XIV). Mas do Século XIII para trás, limitamo-nos a contemplar o enorme
vazio que se transforma rapidamente numa grande interrogação.
Como surgiu o aglomerado urbano? O que levou as populações a fixarem-se neste local?
O
argumento veiculado por diversos autores, de que as constantes guerras
entre cristãos e muçulmanos teriam impedido a existência duradoura de
povoações nesta região, longe de constituir um obstáculo, uma barreira
intransponível, deve transformar-se num incentivo para procurarmos
sinais mais recuados. Muito mais recuados do que a ocupação romana.
A
pretensa localização em Portalegre da Ammaia romana, que durante
séculos foi considerada certa, esfumou-se, desapareceu, no início dos
anos trinta do século XX. Uma inscrição epigráfica esclareceu
definitivamente a questão: Ammaia situava-se junto a Marvão, no lugar de
Aramenha.
Então, quanto a Portalegre e à sua origem, podem existir não uma, mas uma multiplicidade de respostas.
Vamos
recuar no tempo, vamos penetrar nos tempos imemoriais de antes da
escrita, na Pré-História, plena daquela “sensação de presságio” de que
falava Giorgio de Chirico.
A região de
Portalegre foi habitada desde o Paleolítico Inferior, como o demonstram
os achados de seixos rolados e lascas atribuídos ao Acheulense inferior e
superior e ao Languedocense na jazida pré-histórica de Porto da Bôga,
freguesia de Alegrete, estudados por Manuel de Oliveira Jorge e Eduardo
da Cunha Serrão. Esta jazida inscreve-se nas que existem em todo o curso
do rio Caia, e que tem sido estudadas desde 1920 por Henri Breuil.
Mais
recentes, entre o quarto e o início do terceiro milénio antes da nossa
era, encontramos diversas manifestações do Megalitismo. As antas das
freguesias de Urra, S. Lourenço, Fortios e Alegrete, são testemunhas
mudas, da permanência milenária do homem nesta região. Merecem um
destaque particular as antas de Entre Ribeiras, Misericórdia, Monte
Nogueiro e Campino. Os vestígios romanos, esses encontram-se em
abundância em Fortios, Urra e Alegrete.
Por
fim, assinalam-se também os enigmáticos túmulos antropomórficos, de
origem desconhecida mas presumivelmente proto-cristãos, se encontram
representados no concelho – Almojanda, Curral de Jaco, Tapada do Álvaro e
Desvário.
As construções de falsa cúpula, estas abundam e disseminam-se um pouco por todo o lado.
Todos
estes vestígios testemunham uma permanência humana milenar que
antecedeu a formação do aglomerado urbano. Quanto a este, ele é,
certamente, medieval, com a fortificação de uma elevação – onde está o
castelo – dominante do vale que constituiu, ao longo dos séculos, uma
rota comercial que atraiu viajantes através deste Porto Alegre.
Porto:
lugar de passagem. Alegre, pela verdura decorrente da água abundante.
Que contraste com as regiões circunvizinhas, mais áridas e secas!
Quem resistiria a fixar-se num lugar destes?
(texto da autoria do Prof. Doutor António Ventura)
(Texto In, http://www.cm-portalegre.pt/page.php?page=845)
(Imagem In, http://c2arquitectos.blogspot.pt/2007/04/braso-de-portalegre.html)
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