Não sei quantas almas tenho.
Cada momento mudei.
Continuamente me estranho.
Nunca me vi nem achei.
De tanto ser, só tenho alma.
Quem tem alma não tem calma.
Quem vê é só o que vê,
Quem sente não é quem é,
Atento ao que sou e vejo,
Torno-me eles e não eu.
Cada meu sonho ou desejo
É do que nasce e não meu.
Sou minha própria paisagem,
Assisto à minha passagem,
Diverso, móbil e só,
Não sei sentir-me onde estou.
Por isso, alheio, vou lendo
Como páginas, meu ser.
O que segue não prevendo,
O que passou a esquecer.
Noto à margem do que li
O que julguei que senti.
Releio e digo: «Fui eu?»
Deus sabe, porque o escreveu.
Fernando Pessoa
Foto (In, https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjI5iE_N9IjquzOzPHo9jz__m-i4afg47QEvniR3RDpT9_yrB2nkv57CYeqdIL2suM9m10kNocEJ0KJGcZImj8PWDMiNRwfeYg84e3azbqt2tVx7_0sHllJhyphenhyphenx09y9Y-ulKXpUyTqAC1AQz/s1600/fernando+pessoa.gif)
2011/06/13
Não sei quantas almas tenho
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